A história de amor entre as empresas espanholas e a China: o número de empresas espanholas a operar na China triplica em tres anos e as cidades chinesas concorrem ferozmente pela atração do investimento espanhol

Em 2013, cerca de 2.800 empresas espanholas exportaram para o gigante asiático. Três vezes mais do que em 2010. E cerca de 168 empresas dos nossos irmãos contam já com escritório local na China.

Empresas espanholas

Até o ponto que na Espanha, começa a observar-se uma concorrência feroz entre as maiores cidades chinesas para acolher as sedes locais das principais empresas espanholas. A Hong Kong e Shanghai, juntaram-se recentemente Beijing, Shenzhen e Guangzhou. O subdiretor geral da agência de atração de investimento de Hong Kong, Howard Davis, descrevia o seu empregador às empresas espanholas no início de março, num seminário organizado em conjunto com a Câmara de Comércio de Madrid, como “um dos poucos lugares da Ásia onde é possível levar o Governo local aos tribunais e ganhar”. Howard continuou a exposição por referir que em Shanghai, por comparação, o IRS e as contribuições sociais das empresas são o dobro e o IRC é 50% superior ao praticado nas antigas terras da sua majestade, onde não existe o IVA. Na lógica de Álvaro Hernández-Puértolas, da sociedade de advogados espanhola Net Craman, HK é uma ponte formidável para o mercado chinês. Para além da proximidade física, que facilita um muito melhor serviço pós-venda, os consumidores chineses olham para HK como uma grande loja onde conhecem novas marcas às quais se fidelizam. Mais ainda, os impostos locais são cinco pontos inferiores aos praticados na Europa.

Shanghai

O desafio será então perceber qual a razão que levou a mais de 300 empresas espanholas a abrirem a sua filial em Shanghai. Empresas como Bodegas Torres, no setor das bebidas alcóolicas, ou Gowex, concentrada em desenvolver sistemas municipais de wifi, justificam a sua escolha por uma maior proximidade aos clientes, espalhados por várias cidades chinesas. Mais ainda, HK ainda é considerado “estrangeiro”, facto este que dificulta a contratação de pessoal, ou a emissão de faturas. Se o que se pretende é estar perto daqueles escritórios onde se desenha a estratégia das empresas chinesas e se identificam novos sócios, a escolha deverá ser Shanghai ou Beijing, e não HK. Por essa razão, as empresas espanholas a operar em setores de atividade mais controlados ou regulados pelo Estado (os exemplos mais claros são os do banca – Santander ou BBVA – e das utilities ou energias renováveis – Iberdrola, Acciona, Abengoa, Telefónica, Técnicas Reunidas ou Gamesa, ou, no caso português, a EDP Ásia) têm optado claramente por Beijing para abrir os seus escritórios. O fator cambial entre o dólar de HK e o yuan acresce ainda maiores incertezas.

Yuan e Euro

O exorbintante preço do metro quadrado de escritório, bem como o aumento significativo dos salários nestas três cidades têm motivado uma forte aposta de outras empresas em outras cidades. É o caso do Grupo Mondragón, maior grupo empresarial do pais basco, que deslocalizou a sua filial de HK a Jiangsu (província 50 km a norte de Shanghai). Nessa província, “os custos da mão-de-obra são 15% inferiores, a compra ou aluguer do espaço 30% inferior e o preço dos fornecedores 10% mais barato”. O mesmo papel de Jiangsu em relação a Shanghai é desempenhado por Guangdong em relação a HK. Em Shenzhen, o IRC é de 15%, inferior aos 16% e 25% praticados em HK e Shanghai. Mais ainda, os cargos mais qualificados, não pagam IRS. Shenzhen é ainda a sede de gigantes tecnológicos como Huawei, ZTE ou Tencent, de automóveis como BYD e financeiros como China Merchants Bank. Guangdong é de uma forma geral a província com maior PIB da China, ocupando o sétimo em PIB per capita. A Câmara de Comércio dos EUA no Sul da China concluia num estudo recente que 200 dos 500 maiores grupos empresariais mundiais têm pelo menos uma filial em Guangdong. Do lado espanhol, Guangdong acolhe a sede de grupos empresariais como Roca, equipamentos para casas-de-banho, Gestamp, automóveis e renováveis, e Ormazabal, distribuição de energia elétrica.

Apesar de algum abrandamento da economia chinesa, continua a crescer entre 7%-8% ao ano (7,7% em 2013 e uma meta de 7,5% em 2014). O país ultrapassou pela primeira vez os EUA e assumiu-se como país com a maior percentagem do comércio mundial em 2013, mais de 10% (um aumento impressionante quando comparado com os 3% observados em 2000). Nos próximos anos, a classe média chinesa alcançará os 600 milhões de pessoas.

A classe média chinesa

O investimento chinês em ativos e empresas além fronteiras é muito marcado. Não apenas em utilities ou sector financeiro, como podemos constatar em primeira mão em Portugal, mas também em setores como o turismo (ver a este respeito o artigo sobre “China, los amos del turismo en Europa”). Mas as oportunidades também existem do lado inverso, de investimento e exportação no mercado chinês, sendo a presença de empresas espanholas particularmente importante em energias renováveis, finanças, medicina, banca, infra-estruturas, transporte, produtos alimentares e turismo.

Alsa, Técnicas Reunidas, Bodegas Torres, Gamesa y Zara constituem-se como as empresas espanholas com maior presença no mercado chinês, segundo o portal IberChina. Vejamos as suas experiências individuais.

A empresa de transporte coletivo Alsa foi a primeira a apostar na China, no ano de 1984. Fê-lo com uma empresa de taxis na zona especial de Shenzhen. Em 2010, operava já linhas de transporte coletivo em 17 províncias, cobrindo mais de 500 destinos, e com uma frota de 8.000 empregados e 5.000 autocarros.

Técnicas Reunidas

Técnicas Reunidas, que precisamente na semana passada obteve um contrato financiado pelos Bancos Asiático e Islâmico de Desenvolvimento no Bangladesh para construir uma central térmica de ciclo combinado de 500 MW, foi a primeira empresa espanhola a desenvolver um projeto tecnológico na China, Uma planta petroquímica, em 1988, na cidade de Fushun. Sucederam-se vários outros projetos de maior dimensão no setor petroquímico e siderúrgico.

Bodegas Torres optou por uma entrada mais clássica no mercado chinês, através de uma joint venture com uma empresa local. Hoje, as vendas na China representam o dobro das suas vendas na Espanha.

Gamesa, apesar de apenas ter entrado no mercado chinês em 1995, com a constituição de uma fábrica em Tianjin, opera já como distribuidor de turbinas eólicas em mais de 60 parques da China, e, mais ainda, gere uma capacidade superior aos 3.000 MW. Tianjin constitui-se na maior base produtiva da empresa fora da Espanha.

Inditex aterrou na China em 2004 e possui hoje mais de 500 lojas (149 apenas da Zara, 64 da Stradivarius, 61 da Bershka, 60 da Pull&Bear, 50 da Massimo Dutti, 39 da Oysho, … ). A China constitui-se no seu segundo mercado em número de lojas, apenas superada pela própria Espanha.

Inditex

Em produtos alimentares, o azeite merece especial atenção. A China ocupava o 44.º lugar na classificação de maiores clientes do azeite espanhol em 2003. Dez anos depois, ocupa o sexto lugar. Com um crescimento de 8.000%, as vendas anuais alcançaram em 2013 as 25 mil toneladas. Em muitos países do mundo, o azeite italiano domina o mercado, mas na China, os azeites espanhóis conseguiram marcar presença forte e controlam cerca de 62% do mercado de azeites importados. A mudança de gostos e a descoberta de novos produtos por parte da nova classe média chinesa fará sem dúvida da China o maior cliente mundial de azeite. A marca “Aceites de Oliva de España” apostou em Dezembro em promover os seus produtos no programa de culinária Heart of the Home, do Travel Channel. O público-alvo: mulheres de elevado poder aquisitivo. Os quatro capítulos patrocinados foram vistos por mais de 20 milhões de espetadores na China, mas também nas redes sociais chinesas Weibo (Twitter chinês) e Youku.com (You Tube Chinês). A iniciativa foi ainda complementada com uma campanha publicitária nas publicações Trend’s Health, Modern Weekly, Beijing Lifestyle e Shanghai Time, e com uma ampla gama de ações de degustação em supermercados, mas com especial presença nos corredores dos metros de Beijing, de Shanghai e Shenzhen. Em total, um custo de 4,5 milhões de euros. Esta última iniciativa poderá não parecer ter muito impacto, mas a verdade é que a circulação diária de passageiros nas três cidades no seu conjunto é de 20,5 milhões de pessoas. Mais ainda, em apenas três atividades de degustação e de preparação ao vivo de tapas participaram um total de 7.300 pessoas. Os número na China têm outra dimensão.

Azeite na China

Sirvam estas como ideias e desafios aos agentes económicos e institucionais do outro país da península.

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2 respostas a A história de amor entre as empresas espanholas e a China: o número de empresas espanholas a operar na China triplica em tres anos e as cidades chinesas concorrem ferozmente pela atração do investimento espanhol

  1. Olá, Enrique
    Acho que houve um engano. Jiangsu não é uma cidade, é uma província, ao sul de Shanghai.
    Ótimo texto, parabéns!

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